Tão somente.. só.

Talvez o melhor a se fazer quando se apaixonar à primeira vista por alguém seja fugir. Evita o sofrimento posterior e a presença de preocupações e tantos anseios. 

A primeira vez que eu o vi, meu coração disparou. E não falo isso utilizando o mais comum dos clichês - realmente aconteceu. Demorei muito tempo pra reencontrá-lo de novo, mas alguma força misteriosa no universo preparou um encontro totalmente inesperado, em uma cidade diferente e em um tempo descomum. No entanto, ainda não era a hora. Só que um dia, a hora chegou. Ele percebeu o que havia em meu olhar, então, nos aproximamos. E uma experiência tão maravilhosa foi concebida, desejando que ela fosse eterna. Não foi. E as coisas foram desmoronando - porém, se reergueram perto do fim. Voltaram com total intensidade, resplandecendo num compasso absoluto de ilusão amorosa que obstruiu qualquer tipo de olhar sobre a verdade. Porém, a verdade veio a tona, e o sentimento que ele nutria era por outra pessoa. As esperanças eram todas falsas. Não bastava toda a cumplicidade entre nós. Necessitava de muito mais do que isso: como lutar contra um relacionamento de bagagem temporal muito maior que o que passamos juntos? Estou em ruínas. A ficha caiu e teria sido tudo mais fácil de se enfrentar caso nunca houvesse essa aproximação e o meu amor se mantivesse platônico e tão impossível quanto um dia fora. Ou ainda é.


 

Incontinência da Ambiguidade - CAPÍTULO FINAL: Desilusão necessária.

   Claro que não havia motivos de insegurança. 15 gostava de 09 e não queria prejudicá-lo. Isso já devia estar claro. E estava, apesar de 09 não enxergar.
   Como previsto, 09 retornara e mais uma vez deu um jeito de reacender aquele fogo que parecia estar no fim e quase se apagando dentro do Androide 15. E com poucas palavras, ele conseguia traçar seu objetivo, sem qualquer dificuldade. 
   Toda vez 15 despertava a ilusão de que o momento seria agora. No entanto, não era. Mas não havia muitas expectativas e ele já estava mais forte. Era apenas um hábito ou um passatempo. Acontecia e ele já estava preparado, pois a história se repetia.
   Até que numa dessas madrugadas, às 2h30, o Androide 09 subitamente apareceu. O momento parecia finalmente ter chegado. Alarme falso, novamente. Infelizmente só serviu para alavancar de uma forma inexplicável a brasa dentro do 15:

15 - O que você tá fazendo??
09 - Pensando em 1000 coisas..
15 - E eu sou u..
09 - Umas delas é você!
  
   Simples assim. 
   
  Uma pena se logo após isso o Androide 09 voltasse a sumir. Entretanto, aconteceu o temido. E a chama dentro do 15 de um jeito ou de outro vai ter que ser apagada. 09 pediu para esquecer do número do 15, que, ferido, pediu para ele nunca mais ligar. Esse deve ser o final da história. 15 e 09 não nasceram para ficar juntos - é uma espécie de amor ambíguo que só causa sofrimentos ao invés de alegrias. Um espinho e o outro cicatriz.
   

Incontinência da Ambiguidade - CAPÍTULO TRÊS: A insegurança deserta.

   Embora não tivessem se visto pessoalmente, o Androide 15 e o Androide 09 estavam mais próximos que antes. E íntimos também. Apesar do desejo seguindo a risca sua pele, ainda não podia arriscar. Havia uma insegurança enorme dentro do 09.
   Essa insegurança era a causadora da escassez de notícias que pinta a próxima etapa dessa história. 09 começava a sumir e aparecer quando quisesse, e por mais que 15 o procurasse, não o encontrava. Ele sabia onde 09 estava, mas 09 não queria que ele soubesse e se silenciava.
   15 resolveu se valorizar e esquecer essa história. Podia ser uma grande e apaixonante aventura, mas o esforço não tava valendo o sacrifício. "Chega", pensou. E não procurou mais 09. 
   Ele nem lembrava mais de sua existência no momento em que 09 aparecia de algum jeito. Eram constantes as ligações ou mensagens no celular no meio da madrugada. 15 ficava feliz, embora nem sempre ouvia o celular às 2h30 da manhã. Mas no outro dia, parecia que nada havia acontecido e não havia mais notícias de 09. 
   Essa falta de consideração desgastava os ânimos de 15, que se irritava a cada dia por lembrar que 09 possuía uma insegurança tão imensa que o impedia de continuar vivendo, caso quisesse prosseguir com essa história. Ele optou por não querer mais, mas 09 voltaria a procurá-lo muito em breve, o que no fundo, 15 já imaginava.

Incontinência da Ambiguidade - CAPÍTULO DOIS: O dito pelo não dito.

   A máscara tinha sido arrancada. O Androide 15 não era tão detalhista, mas certas coisas marcavam e jamais passariam despercebidas. 09 ficou preocupado e inseguro, mas 15 não possuía intenções de prejudicá-lo, pois entendia, de certa forma, o que se passava dentro de sua cabeça. Não era fácil agir diferente. Porém, a forma do contato entre eles ainda não tinha evoluído.
   Apesar da insegurança, a história foi tomando novas formas e 09, aos poucos, ia ganhando a confiança de 15. Tanto que foi proposta uma viagem para que os dois pudessem se entender melhor. Mas 15 rejeitou - não podia aceitar algo de alguém que era apenas o número 09. Não sabia nem o que havia atrás do número privado
   Contudo, e com o tempo, os números privados viraram "públicos" e 15 vencia do mistério essa pesada batalha. Não a guerra. Mas essa vitória foi fundamental pois estabelecia a principal e melhor forma de contato. 
   09 queria se apoderar de um jeito do Androide 15 que o fez recuar. 15 prezava a liberdade que possuía de tal maneira quanto 09 queria o prender. E 09 dizia palavras que o laçavam e o traziam para dentro de sua prisão.
   15 não esqueceu aquela ligação às 6h e reticências da manhã no primeiro dia do ano e nem muitas das coisas que foram ditas. E que ainda seriam ditas. Infelizmente.

Incontinência da Ambiguidade - CAPÍTULO UM: A força da curiosidade.

   O bate-papo da internet deu sinal de vida com um pedido mediado por terceiros do e-mail e telefone do Androide 15, que relutou nos primeiros instantes. 15 não podia passar essas informações para desconhecidos! Mas a persistência foi tanta que o e-mail foi gentilmente cedido, e se iniciava a história que não era tão saudável quanto aparentava.
   Conversava com um e-mail fake, e o mistério da identidade foi mantido por algum tempo. E esse mistério era tão forte que, de alguma maneira, excitava intensamente o 15, que resolveu passar o número do celular. A primeira conversa rendeu várias horas e pistas. Foi interessante e instigante. Conversavam sobre a vida, desejos, e outras curiosidades. E a tensão do suspense e identidade não-revelada só fazia por aumentar.
   Tinha vezes que 15 se irritava com essa história de não saber com quem lidava. No entanto, dava toda atribuição necessária afim de desvendar esse mistério, se submetendo a humilhações próprias como  seguir ordens. Desejava descobrir muito mais que qualquer outra coisa.
   Era extremamente difícil ficar esperando qualquer contato repentino. 15 só possuía o falso e-mail. Apenas. Somente. Só restava esperar as chamadas de um número privado ou mensagens virtuais que eram trocadas no calor da madrugada. Esperar. Num dia sem expectativas o telefone tocava. Ou não.
   Mas tudo tem um fim. Mesmo procurando diversas vezes e seguindo as pistas fornecidas, nada era encontrado, o que apresentava apenas a hipótese da falsidade das pistas. Apesar do árduo trabalho, o Androide 09 foi identificado. 

Desabafos

É aniversário de Martha. Mas algo deixa o coração dela triste: seu melhor amigo não está por perto. O mesmo melhor amigo que tem ciúmes dela com outros amigos. Esse a deixou nesse momento para aproveitar uma balada. Trocando beijos na boca pela companhia da melhor amiga, no dia de aniversário. Talvez não exista nada de importante nesse dia. Porém, um melhor amigo faz falta naquela meia-noite. E se ele liga para parabenizar? A ligação foi um pouco ruim, e ele perdeu a cabeça e xingou a aniversariante. A sua melhor amiga. Da boca pra fora, talvez. Mas no coração de Martha, isso machuca até hoje. 

Os dias passam, no entanto, as decepções sempre vão existir.
As decepções não morrem, apenas saem de férias. Ou entram em férias. Martha está sendo destratada por amigos que ela jamais imaginaria que fizessem isso. Será que Martha fez alguma coisa? E o que terá sido? Ela não sabe as respostas, porque pra ela, não tem como pensar numa pessoa melhor de ser amiga que não seja ela mesma. Ela própria. 
O que é amizade? É chamar o outro pra fazer algo quando não tem mais ninguém ou não tem mais nada o que fazer? É estar acostumado com a companhia dele a ponto de se acomodar de convites sem o real desejo existir? É deixar o outro mesmo em momentos especiais e procurar prazer próprio e egoísta? É ser capaz de multar por comportamento indevido, mesmo que haja compreensão? 
"Se isso for amizade, eu não quero mais ser amiga de ninguém." 
MARTHA